domingo, 20 de maio de 2012

Céu montanhoso

O novelo cai, desenrolando toda memória
Como pode, um fiozinho de saudade criar tanta comoção?
Esses momentos de solidão trancafiam os desejos
escapando o medo de viver.
(errar)
 
E quanto mais foge o novelo,
maior fica,
os rastros de fio interminável,
os nós do algodão neurológico,
as sinapses inacabadas.
Onde foi que deixei faltar?

A ressaca é moral dessa vez.
Observo calmamente minh'alma mal polida.
Meus olhos são falsos.
Eu não sou quem digo ser,
eu não sou quem quero ser.
Eu já quis ser melhor,
só pelo prazer de poder provar
que posso ser melhor
(eu sou melhor que você)
fracassei.

Eu sou muito menos do que o sonho exige de mim.


sábado, 12 de maio de 2012


Do lado de dentro

O ano inteiro em um casúlo e eu não pretendo sair tão cedo. É que não estou pronta para o mundo, como um mundo inteiro. Diferente do meu mundo, dentro do casúlo, desta casca endurecida que mal eu caibo mais. Mas e daí que está apertado demais, doendo até os meus ossos ? É só… curvar-me um pouco mais, ajeitar-me um pouco mais, expremer, sem nunca exprimir, o peito um pouco mais… A dor aqui não é tanta quando o medo de lá.

Fisiologia

Despi meu corpo, e em carne e osso me expus
Assim como sou, crua e nua.
A carne ainda quente, pulsante e dolorida.
Dói, dói, dói, enquanto pulsa pulsa pulsa.
O pulso ainda pulsa, mas só pulsa, e eu o sinto no chão que eu piso.
Gelado o piso.
bege cru assim como a morte que se mostra no açouque
a morte limpa, bonita, mal-cheirosa, como ela é e com o gosto que tem
e eu estava lá, crua e nua por fora
de dentro para fora, a morte
forte,
que esfaqueia meu ser,
meus olhos,
meu eu.

Pedras Sabão.

Não perdoa mais a dor que aperta o peito e vem da alma,
com a calma de quem não quer ver acabar
o presente que foi o passado
De mim para si
De nós para o fim
Difícil que é esquecer
antes fosse cometer
O vermelho que mancha esse romance
Em preto e branco retratado em três por quatro
Com formato de carteira e cheiro de saudade
E escorrem os olhos, as promessas
pelas beiradas do orgulho
que recolhe os cacos de vidro
e confeites
do carnaval fora de hora
Enqanto bêbados equilibristas
seguem no meio-fio,
escorrendo a maquiagem de ressaca,
na alegria de um velório, como num bloco.
Enfim fecham-se as portas do cortiço,
no começo da manhã de domingo.

Meia vida

É stress.
A resposta para todo e qualquer mal que me assombra.
Dor no pescoço, é stress.
Meu coração palpitando, é stress.
A vista embaçada, é stress.
O mal do século, a melhor desculpa inventada.
…e daí que descem os remédios,
os analgésicos,
os anestésicos,
licítos
ilícitos…
é o stress.

Sete

Eu procuro sinais e não encontro, me diz o que faço de errado ?
É o jeito que eu peço, que eu penso, que eu peco, que eu falo, que eu ajo, que eu existo ?
Eu procuro sinais onde não se encontram. Na lama, no caos, na glória, é tudo a mesma bosta, e por que não estão? São.
Rasgo meu casto com a alma, e bebo de mim toda calma, nem raiva absorvo, observo ao invés de sentir.
Eu posso comer essa terra e dizer que é sagrada, balançar meu corpo com os olhos fechados, cantar olhando pro céu, gritar pela cura, cair no chão e enrolar a língua. Fazer tudo isso em teu nome, e mesmo assim não te sinto.
Quando te chamo, não ouço resposta,
Quando eu peço, não recebo,
Quando eu olho, não vejo,
Quando eu faço, eu não sinto.
Me diz por que não acho o teu sinal em mim ?

De cá pra cá

Por mais que eu tenha vivido, os dias são todos iguais. Em 17 primaveras, nunca a vi. E nessa época agora, que vejo nas vitrines, cabides, as máscaras enfeitadas, desejando que todas outras e quaisquer máscaras fossem tão fáceis de se adquirir e de se retirar, passei 17 carnavais com a fantasia nua de ser.
Meus dias começam pela metade, e terminam no início do próximo, na espera de… de que eu não sei, é só a espera ao meu lado no sofá, a tv ligada pra nada, só pra distrair, as luzes e o som do comercial do supermercado, anunciando que nesta quarta, o peixe é mais barato. Eu penso no mar.
É tudo tão bonito fora de casa, mas eu me contento nessa viagem de alma, meu corpo parado, enquanto meus olhos acompanham e desenham os lugares, na verdade o lugar, eu vejo as ladeiras, os tijolos de barro, a tintura descascada e as moças apoiadas no peitoral da janela enquanto conversam, os ladrilhos escorregadios fáceis de se tropeçar, as portas de madeira, e os senhores numa mesa de bar.
As coisas que só os olhos de dentro enxergam, eu fecho os meus e durmo, é menos um dia de 17.

sábado, 5 de maio de 2012

17

Cinco de Abril, 2011
Sobra no meu peito
o teu sorriso que me invade,
nesses todos carnavais
em que estive mascarado.

Paguei os meus pecados
sob a fantasia de frade.
Orei, meus olhos fechados,
chorei, de alma embriagada.

Colhi as flores desse asfalto
Nesses todos carnavais,
nesses tantos carnavais.

Fecharam-se os punhos
no meu rosto inválido
Casaram-se os castos
no altar pagão dos atos,
e a cena se repete:

Vinte quadros mudos,
a música celebrando
os brasileiros surdos,
às fantasias do Planalto.

Braile

Com o peito aberto,
escancarado,
todo dado
o vadio...
A natureza é uma linguagem
de difícil leitura,
fácil descrição,
enganosa interpretação
E eu...
Que não sei nem ler os teus olhos,
saberei ter
o teu coração sem dono?
Vira-lata que sou...